"podemos marcar um ponto no espaço, um momento no tempo, mas o espaço e o tempo escapam ambos ao nosso controle"
esta frase finaliza o documentário rien que les heures (1926), de alberto cavalcanti, que assisti ontem no segundo dia de aula do curso de história do documentário, oferecido pela eca/usp. é incrível como este cineasta-diretor-arquiteto-cenógrafo-roteirista dialoga com a questão do tempo, espaço e cidade. considerado o criador do gênero "city simphony", o brasileiro radicado na frança vai além deste rótulo pois, apesar de começar o filme mostrando que toda cidade é reconhecida pelos seus monumentos, mostra uma paris cheia de contrastes que qualquer cidade "cartão-postal" quer esconder. um exemplo é a cena em que um homem vai ao restaurante e, quando a câmera se aproxima de seu prato, vemos todo o processo que levou aquele pedaço de carne a estar ali, pronto para ser comido. ao mesmo tempo, percebe-se que o cara que matou o animal, para que ele fosse comido pelo homem no restaurante, não tem dinheiro para freqüentar um ambiente daqueles, nem comer aquele pedaço de boi. sabe-se que cavalcanti volta ao brasil na década de 1940 e depois de atritos com a vera cruz, onde realizou apenas três filmes, volta à frança e trabalha em mais de cinqüenta obras. rien que les heures não chegou a ser lançado, mas há uma cópia em película na cinemateca brasileira e no mam, em são paulo.