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sábado, 21 de abril de 2007

pra mim, chega

tinha 28 anos quando morri, em 1972. fui, como vocês chamam hoje, um homem-multimídia. jornalista, ator, cineasta, escritor, poeta, músico... tive letras musicadas pelos amigos gilberto gil, edu lobo, caetano veloso, maria bethânia, nana caymi. tive amigos importantes, mulher, filho. ah! fui um dos idealizadores da tropicálica, já ouviu falar? viajei pela europa, américa do norte. fui comparado a kerouac, ginsberg. que nada! (será que é por causa da bebida?) tive contato com o movimento concretista e do cinema conheci júlio bressane, sganzerla. conheci também hélio oiticica e mais uma cambada de loucos como o waly salomão. como será que estão hoje? eu não sei. sei que um dia depois do meu aniversário me tranquei no banheiro, cobri a janela e as frestas da porta com jornal. liguei o gás do aquecedor e morri. fui pra não voltar e não volto mais desse meu caminho. antes, deixei um bilhete em que escrevi, entre outras coisas, o seguinte: “tenho saudade, como os cariocas, do dia em que sentia e achava que era dia de cego. pra mim chega! não sacudam demais o thiago, que ele pode acordar”. não sei dizer se fui feliz. fiz muitas coisas que quis, mas a verdade é que sempre me senti oprimido, não sei dizer por que ou por quem. conheça minha ´obra´, leia o que escrevi e vai perceber um pouco desta angústia. soube que minha mãe nunca mais foi ao rio de janeiro, colocando na cidade a culpa de minha morte. já meu pai adotou mais de trinta crianças e montou uma creche. meu filho virou piloto de avião e da minha mulher não sei. mas soube que, juntamente com a empregada, procurava restos de escritos que eu rasgava ou queimava quando ficava deprimido e com raiva. com raiva ficou ela, há alguns anos, quando lançaram um livro sobre mim. o autor disse que eu era bissexual, que tive um caso com caetano. não perco meu tempo com esta bobagem. bom, fico por aqui. pelo que soube, o mundo continua uma droga e o brasil, um lixo.


A poesia é o pai da ar-

timanha de sempre: quent

ura no forno quente

do lado de cá, no lar

das coisas malditíssimas;

alô poetas: poesia!

poesia poesia poesia poesia!

O poeta não se cuida ao ponto

de não se cuidar: quem for cortar meu cabelo

já sabe: não está cortando nada

além da MINHA bandeira ////////// =

sem aura nem baúra, sem nada mais pra contar.

Isso: ar. ar. ar. ar. ar. ar. ar. ar. ar. ar. ar. ar. a

r: em primeiríssimo, o lugar.



poetemos pois


[mais torquato neto aqui]